Mark Rutte, primeiro-ministro da Holanda, apresentou um pedido de desculpas em nome do governo de seu país por seu papel na escravidão do passado, que ele classificou de crime contra a humanidade, nesta segunda-feira (19), durante um discurso em Haia.
“Hoje me desculpo em nome do governo holandês pelas ações do Estado no passado”, disse Rutte durante um discurso bastante esperado sobre a participação da Holanda nos 250 anos de escravidão nas ex-colônias.
Rutte também pronunciou as desculpas em inglês, papiamento e surinamês, línguas faladas nas ilhas do Caribe e no Suriname.
“Postumamente a todos os escravos do mundo que sofreram com este ato. A suas filhas e filhos e a toda a sua descendência”, acrescentou. “Nós, vivendo aqui e agora, somente podemos reconhecer e condenar a escravidão nos termos mais claros como um crime contra a humanidade”, detalhou.
Ao mesmo tempo em que Rutte pronunciava seu discurso em Haia, vários de seus ministros estiveram presentes nas ex-colônias de Bonaire, São Martinho, Aruba, Curaçao, Saba, Santo Eustáquio e Suriname, para “discutir” o tema com os habitantes locais.
Após o discurso, houve reações emocionais entre os presentes na sala. Alguns se abraçaram.
Mas a data escolhida pelo governo para se desculpar, que vazou para a imprensa holandesa em novembro, provocou uma polêmica feroz no país e no exterior durante várias semanas.
As organizações de memória contra a escravidão queriam as desculpas em 1º de julho, data em que é lembrado o fim da escravidão em uma celebração anual chamada “Keti Koti” (Quebrar as correntes) no Suriname.
O pronunciamento causou controvérsia com alguns grupos e países atingidos, que, enquanto exigem uma compensação, consideram que a medida foi apressada e dizem que a falta de consulta por parte da Holanda soa como uma atitude colonial.
Era de ouro
A escravidão ajudou a financiar a “Idade de Ouro” holandesa, um período de prosperidade devido ao comércio marítimo nos séculos 16 e 17. O país traficava cerca de 600 mil africanos, principalmente para a América do Sul e o Caribe.
No apogeu de seu império colonial, as Províncias Unidas, conhecidas atualmente como Países Baixos, tinham colônias como Suriname, a ilha caribenha de Curaçao, África do Sul e Indonésia, onde a Companhia Holandesa das Índias Orientais tinha sua sede no século 18.
Nos últimos anos, a Holanda começou a lidar com seu papel no tráfico de escravos e sua história colonial, sem a qual as cidades holandesas e seus famosos museus, repletos de obras de arte de Rembrandt e Vermeer, não seriam os mesmos.
Com o movimento Black Lives Matter nos Estados Unidos, o debate voltou à tona na Holanda, onde o racismo continua sendo um sofrimento para os cidadãos das antigas colônias.
As cidades de Amsterdã, Roterdã, Utrecht e Haia já se desculparam por seu papel no tráfico negreiro.
Rutte, no entanto, se mostrou reticente por muito tempo sobre fazer um pedido de desculpas, ao afirmar no passado que a era da escravidão tinha ficado para trás e que uma desculpa traria de volta as tensões em um país onde a extrema direita segue sendo forte.
Uma pesquisa recente indicou que apenas 38% da população adulta era favorável a um pedido de desculpas.
A escravidão foi abolida no Suriname e em outros territórios controlados pela Holanda em 1º de julho de 1863, mas não terminou antes de 1873, depois de um período de “transição” de 10 anos.
Primeiro passo
A primeira-ministra de São Martinho, Silveria Jacobs, disse aos meios de comunicação holandeses no sábado que a ilha não aceitaria as desculpas se as mesmas fossem apresentadas nesta segunda.
“Permitam-me deixar claro que não aceitaremos desculpas até que o nosso comitê assessor tenha discutido isso e nós, como país, tenhamos discutido isso”, disse.
No entanto, em Aruba, a primeira-ministra Evelyn Wever-Croes disse à agência de notícias ANP que a ilha aceitou as desculpas, mas enfatizou que isto é apenas “um primeiro passo”.
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