Muitos criadores de cães, em busca de ter maior conforto e de garantir a taxa de sobrevida da mãe e dos filhotes, têm optado pela cesariana para o parto de seus pets. Contudo, pouco se sabe a respeito dos efeitos do parto cirúrgico na saúde dos cachorros, especialmente nos seus primeiros momentos de vida. Foi essa investigação que Beatriz de Melo Justo se propôs a fazer em seu Mestrado, realizado na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, da Universidade de São Paulo (FMVZ-USP).
A pesquisa Influência do tipo de parto sobre a qualidade colostral e transferência de imunidade passiva em cães buscou comparar a produção e as propriedades do colostro, que é o primeiro leite secretado pela mãe após o nascimento dos filhotes, em condições diferentes de parto: cesariana e vaginal. Além disso, o estudo avaliou a qualidade imunológica do colostro e analisou quantitativamente a eficiência da transferência de imunidade passiva em cada cenário.
Beatriz concluiu que a cesariana proporciona uma melhor qualidade proteica no colostro, quando analisadas a albumina e a proteína total. Também foi observado que o parto cirúrgico possibilita uma maior e mais duradoura permeabilidade da barreira intestinal, o que aumenta a capacidade dos filhotes de absorver imunoglobulinas, também conhecidas como anticorpos. Esses resultados indicam o contrário do que propunha a hipótese inicial, que, segundo a pesquisadora, era baseada em suposições pessoais e na bibliografia que existia até então.
Relação entre colostro e imunidade
As primeiras amamentações são essenciais para o desenvolvimento dos recém-nascidos. Beatriz explica que a espécie canina possui placenta do tipo endoteliocorial, ou seja, as “barreiras” da placenta são resistentes e dificultam a passagem de moléculas grandes, como as imunoglobulinas, da mãe para os fetos. Por isso, “eles [os filhotes] nascem com uma pequena quantidade de anticorpos, e dependem essencialmente do colostro”, que é um leite mais rico em proteínas e gordura, para construirem seu sistema imune.
As três primeiras semanas de vida dos cães são o período neonatal do filhote, momento crítico e com alto risco de mortalidade. Segundo a literatura, há forte ligação entre a falha na transferência de imunidade passiva e a morte dos recém-nascidos. É nesse momento que o cão desenvolve diversos sistemas, como o imunológico e o gastrointestinal. Ele deve ser capaz de obter nutrientes durante a amamentação, a fim de absorver componentes importantes para proteção, como os anticorpos, leucócitos, fatores de crescimento e hormônios. Nesse sentido, compreende-se porque é fundamental investigar quais os efeitos dos diferentes tipos de parto nas propriedades do colostro.
A cesariana é o melhor procedimento?
Beatriz destaca que não é possível concluir categoricamente que o parto cirúrgico seria melhor para os filhotes. “A diferença que eu encontrei não permite que eu afirme que é esse colostro que eu devo priorizar”, explica. Ainda é preciso pesquisar sobre os impactos da cesariana em outros tipos de proteínas e imunoglobulinas.
A mestre em Reprodução Animal acrescenta que outros fatores devem ser considerados em estudos futuros, como a duração da fase expulsiva do parto, o tempo operatório e os níveis de hormônios na mãe e no feto — como o cortisol, o hormônio do estresse, e as catecolaminas, um grupo que reúne dopamina, adrenalina e outros hormônios. Além disso, o modelo de aleitamento, seja controlado ou por livre demanda, pode mudar a transferência da imunidade passiva, uma vez que interfere no volume do colostro ingerido.
De toda forma, a pesquisadora está satisfeita com a pesquisa e com suas conclusões: “Os resultados que nós encontramos abrem portas para coisas que nós não tínhamos pensado lá no início. Sempre é válido abrir os horizontes e pensar em outras ideias”.
Fonte: FMVZ-USP, adaptado pela equipe Cães e Gatos VET FOOD.
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